A possível aliança do PSDB com o MDB ou o PSD tem sido amplamente debatida na mídia como uma alternativa para o partido, que se fragilizou ao longo dos anos devido a divisões internas e à crescente radicalização do país. O sensato e experiente presidente Marconi Perillo busca a melhor reengenharia política para preservar o que é mais valioso: a história e o conteúdo partidários.
Defendo, como muitos, que o caminho ideal seja uma fusão – e não uma incorporação ou federação – e que essa fusão ocorra com o MDB, e não com o PSD, neste momento. Explico: essa união não apenas fortaleceria os três partidos envolvidos, mas também contribuiria para a racionalização e a visibilidade do sistema partidário brasileiro, algo essencial para o país.
O MDB, protagonista da redemocratização, teve um papel histórico fundamental ao lado de seus principais interlocutores – o PSDB e o PT, que trouxe o povo brasileiro para o centro da agenda política. O antigo PFL, talvez moderno demais para seu tempo, também compôs esse cenário, superando legendas históricas como UDN, PSD e PTB. Apesar das divergências regionais que dificultam sua coesão nacional, a trajetória do MDB é inegável.
O PSDB, originado do MDB, foi peça-chave nas reformas macroeconômicas, na estabilização promovida pelo Plano Real, nas privatizações e na modernização do Estado. Ambos os partidos, originalmente de centro-esquerda e inspirados na social-democracia europeia, evoluíram para um reformismo modernizante, focado na liberalização econômica e na modernização do Estado – ainda que, como sabemos, de maneira insuficiente.
É essencial reconhecer nossas conquistas, mesmo que ainda distantes dos nossos maiores ideais. O Brasil avançou. Ignorar os acertos desse amadurecimento nos condena ao populismo e à frustração coletiva. Aposto que o eleitor começa a compreender onde está seu verdadeiro interesse – com a intuição de um pai, de uma mãe ou de um jovem. Como dizia Darcy Ribeiro, “brasileirinhos e brasileirinhas”. Já chegamos ao “inflação nunca mais” e ao “basta de corrupção e privilégios excessivos”. Logo, chegaremos ao “basta de déficits e juros estratosféricos”.
As agendas modernizantes do Brasil foram impulsionadas por FHC e Michel Temer e, em parte, continuadas sob Bolsonaro/Paulo Guedes. A maioria da esquerda ainda defende um distributivismo que, inadvertidamente, alimenta o rentismo. O fato econômico é claro: não haverá salários altos no Brasil sem uma forte demanda por trabalho, dentro de um cenário de eficiência econômica, altos investimentos privados e um ambiente de negócios atrativo. O mundo investiria aqui – mas, por enquanto, isso ainda não acontece.
As reformas do Governo Temer, com o plano “Uma Ponte para o Futuro” foram impactantes, resultando em juros de 6% ao ano, um incentivo à produtividade e à competitividade. Diante de um mundo ainda mais complexo, esse plano precisa de uma nova edição. Para isso, reforço a proposta de fusão entre PSDB e MDB, formando o MDSB. A ideia de continuidade evolutiva deve ser um antídoto contra nosso trágico hábito latino-americano de “começar tudo do zero” – um erro que tem mutilado o futuro de gerações.
O PSD, sob a liderança do habilidoso Gilberto Kassab, se posiciona como um partido de centro, mas sua origem remete ao antigo PFL de Jorge Bornhausen, uma legenda liberal e programática que posteriormente se dividiu entre DEM e PSD. O DEM, por sua vez, foi absorvido pelo híbrido União Brasil, que pode – ou não – se alinhar melhor ao PSD, resgatando parte de sua identidade original. Assim, o PSD ocuparia um espaço à direita do MDSB, e ambos poderiam incorporar partidos menores de orientação semelhante. Teríamos, portanto, dois grandes partidos de centro originados de tradição política.
No espectro mais à direita, PL e Republicanos se consolidam com clareza, ao lado de outras legendas menores que, por racionalidade, deveriam se fundir com os maiores – algo que teria sido facilitado se o STF não tivesse barrado cláusulas de barreira mais rígidas no passado. Essa reorganização ainda deveria ocorrer.
À esquerda, PT, PSB e PDT permanecem como os principais representantes, enquanto partidos como PCdoB e PSOL parecem cada vez mais deslocados da realidade. O único comunismo funcional hoje é o chinês, que, na prática, opera como um capitalismo de Estado – um modelo que esses partidos não defendem.
O Brasil precisa de uma reforma política muito mais profunda do que simples fusões motivadas por conveniência eleitoral ou coerência ideológica mínima. Ainda assim, é interessante notar que nossa vibrante diversidade política, com todas as suas contradições, nunca ocorreu na vizinha Argentina, onde praticamente quase todos foram absorvidos pelo peronismo – como se, no Brasil, tivéssemos sido quase todos petebistas desde Getúlio Vargas.
Por fim, a régua ideológica é mais multidimensional do que este recorte sugere. Tampouco é certo que os partidos políticos serão a solução para os desafios do futuro. Até o momento, porém, não se inventou um modelo melhor. A alternativa é a roleta do personalismo, que pode tanto destruir quanto criar ou regenerar partidos.
Diante de nossa realidade fragmentada e ineficaz, a consolidação de quatro, cinco ou seis grandes forças políticas traria mais transparência, respeito e compreensão ao eleitor. Também abriria caminho para um semipresidencialismo forte, nos moldes franceses, como defende Michel Temer.
Esse pode ser o papel do MDB e do PSDB neste momento: admitir suas imperfeições e falhas, mas afirmar suas conquistas e avanços reais. Demonstrar racionalidade diante de um eleitorado que, ano após ano, perde a paciência com a política. E, acima de tudo, apresentar um novo plano para o país – como fizeram FHC e Temer. Isso poderia motivar os demais grupos políticos a fazerem o mesmo: que todos apresentem seus planos de forma justa e compreensível ao povo brasileiro.
Vinícius Lummertz, cientista político pela Universidade Americana de Paris, foi ministro do Turismo e presidente da Embratur no governo Michel Temer. Foi secretário de Turismo do Governo de SP, secretário de Planejamento de SC e diretor do Sebrae Nacional no governo FHC. É Senior Fellow do Milken Institute e membro fundador da Rota da Seda do Turismo.