A onda de calor intensa que atinge o Rio Grande do Sul neste início de fevereiro entrou para a história climática da região. Segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o estado gaúcho registrou, nesta terça-feira (4), a maior temperatura medida oficialmente desde o começo das medições, em 1910.
A temperatura máxima na estação meteorológica automática do Inmet em Quaraí, na tarde de terça, chegou a 43,8ºC até às 15h, um recorde em 115 anos de medições. Os alertas de perigo de ondas de calor no estado foram emitidas até o próximo domingo (8).
Uma temperatura na casa dos 43ºC nunca antes havia sido registrada no Rio Grande do Sul, superando recordes anteriores de 42,9ºC em Uruguaiana de 27 de fevereiro de 2022; e 42,6ºC em Alegrete em 19 de janeiro de 1917 e em Jaguarão em 1º de janeiro de 1943.
Região de extremos
Maria Clara Sassaki, especialista em Meteorologia da Tempo OK, explica em entrevista ao Portal iG que o Sul do Brasil é uma região de extremos, justamente pela posição geográfica. “Na época de inverno, as massas de ar polar chegam com mais facilidade e a geografia da região contribui para que o frio seja intenso. Já nos meses de verão, que são os meses mais quentes, o calor é intenso também, tanto que a média de temperatura máxima é alta no início do ano”, afirma.
Segundo ela, o conhecido frio da região durante os meses do inverno acontecem pela influência das massas polares. Por ficar no extremo do país, o Sul recebe primeiro as massas frias vindas do Polo Sul do planeta.
Em julho de 2024, o Rio Grande do Sul registrou ondas de frio com temperaturas negativas, chegando a -9ºC, de acordo com o Metsul.
“O que faz a gente achar que no Sul é mais frio que no Sudeste é que no inverno as mínimas são mais baixas, tanto pela sazonalidade, quanto pela influência das massas de ar polar, que atingem primeiro o RS e perdem força no caminho até chegar em outras regiões do país”, comenta a especialista.
Recordes históricos
De acordo com o Metsul, órgão que monitora o clima na região, a temperatura registrada em Quaraí não apenas seria recorde absoluto de temperatura máxima do estado e estabeleceria outros dois recordes: a mais alta temperatura oficial já anotada no Rio Grande do Sul no verão e novo recorde de temperatura máxima para o mês de fevereiro, superando os 42,9ºC de Uruguaiana em fevereiro de 2022.
Os recordes de calor de 1917 e 1943 levaram 79 anos para serem superados, fato ocorrido em 2022. E apenas três anos depois, a marca de 2022 foi ultrapassada.
O que está causando o calor?
A meteorologista explicou que, nos últimos dias, o país teve a presença de um corredor de umidade entre o Sudeste e o Norte, que provocou chuvas volumosas e recorrentes em vários estados. Esse corredor de umidade era uma área de convergência, onde as nuvens ficavam concentradas, localizado ao lado de áreas com condições desfavoráveis para formação de nuvens — Paraguai, Argentina, Rio Grande do Sul, e também mais ao norte, (norte de Minas, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia).
De acordo com Maria Clara, estas áreas foram influenciadas pelo ar seco e tiveram dias com temperaturas muito elevadas. “Eu costumo falar que a umidade na atmosfera funciona como um isolante térmico. Se tem muita umidade, a temperatura não sobe. Mas se não tem umidade, a superfície aquece muito, e acaba formando as ondas de calor”, pontua.
A especialista acredita que o calor no Sul deve perder força, agora que o corredor de umidade se desconfigurou e a chuva começa a voltar gradativamente, aliviando as altas temperaturas. No entanto, se chove no Sul e fica seco no Sudeste, a tendência é que o calor aumente no Sudeste.
Eventos extremos na região
A meteorologista analisa também que podemos evidenciar que os eventos extremos, tanto ondas de calor, como ondas de frio e tempestades severas, estão cada vez mais recorrentes. As ondas de calor de fevereiro, por exemplo, acontecem apenas oito meses após as enchentes históricas que inundaram o território gaúcho.
“Temos observado a temperatura do planeta muito elevada, seja no continente, no oceano ou na atmosfera. E calor significa energia para os sistemas meteorológicos. Quanto mais energia, mais intensidade”, comenta Sassaki.