Menino teve alta da UTI na terça-feira (31) e recebeu visita de sacerdote. Polícia investiga mortes de três mulheres no Litoral Norte. Criança que comeu bolo em Torres escreve carta pedindo orações
Divulgação/Rádio Maristela
A criança de 10 anos que comeu um bolo com a família em Torres, no Litoral Norte, escreveu uma carta pedindo orações por ele e por familiares que morreram após consumir o alimento. O documento se dirige a dois padres cujas missas eram frequentadas pelo menino.
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A criança, que perdeu a mãe, Tatiana Denize Silva dos Anjos, e a avó, Neuza Denize Silva dos Anjos, detalha que não poderia estar presente, pois estava hospitalizado.
“Querido padre Leonir ou Almo, quero pedir que minha mãe, dinda e vó descansem em paz. Que Deus acolha elas e dê a paz eterna. Eu não posso estar presente pelo motivo de estar hospitalizado ainda. Gostaria que fizessem uma orações por elas e por mim. Obrigado”, escreveu.
Padre da Paróquia São Domingos de Torres, Leonir Alves diz que recebeu a carta em mãos do avô do menino, no domingo (29), durante uma missa. Ele detalha que não costumava conversar com a família, mas que a via com frequência no templo.
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Leonir conta que se emocionou ao ler a carta e revela que a comunidade rezou pelo menino ao fim da missa.
“Quando eu abri, eu também me fiquei emocionado com o convite, porque uma criança escrevendo daquele jeito e com toda essa tragédia. Daí eu só perguntei ‘eu posso ler aqui pra rezarmos juntos?’ Então, no final da missa, eu li a cartinha e pedi pra comunidade toda rezar conosco, por ele”, afirma.
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Visita no hospital
Dois dias após ler o pedido do menino, o padre Leonir visitou, na terça-feira (31), a criança no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, em Torres. Ele detalha que o menino recém havia saído da UTI e estava feliz, apesar da tragédia.
“Ele estava faceiro, porque saiu da UTI. Ele me disse ‘só falta um remédio, daqui a pouco eu vou poder ir pra casa'”, afirma.
A criança também falou sobre o dia do episódio.
“O próprio menino disse ‘nós comemos o bolo e foi muito rápido. Em 15 minutos começamos a passar mal'”, revela.
O padre afirma que ficou sensibilizado após a visita, pelo simbolismo das festas de fim de ano, que unem famílias e representam a celebração da vida.
“É muito triste, né? Ainda mais num período que, de modo geral, é alegre. É um período de encontro, confraternização das famílias. Então, eu fiquei muito sensibilizado com isso e, de alguma forma tentando fazer algo, ser presença, pelo menos, estar ali”, diz Leonir.
Mulher que fez o bolo segue na UTI
Das sete pessoas que comeram o bolo, duas continuam hospitalizadas. Na quarta-feira (1º), a instituição confirmou que Zeli dos Anjos, de 60 anos, que fez o bolo, segue internada na UTI por intoxicação alimentar em estado estável, mas teve piora da função ventilatória.
O menino, que é neto de Neuza Denize Silva dos Anjos, a terceira das vítimas, e sobrinho-neto de Zeli, seguirá internado com acompanhamento da pediatria do hospital.
Gosto estranho
As pessoas que consumiram o bolo notaram um gosto estranho ao ingerir o doce, segundo o delegado do caso, Marcos Vinícius Veloso. O alimento, com sabor apimentado e desagradável foi percebido logo nos primeiros pedaços. Zeli chegou a interromper o consumo ao perceber as reclamações.
Família diz sentir “gosto estranho” ao consumir bolo que matou três pessoas em Torres, RS
“Tão logo o menino de 10 anos comeu e também reclamou do sabor, ela meio que colocou a mão assim em cima do bolo, [e falou] ‘e agora ninguém mais come’. E as pessoas começaram a passar mal naquele momento”, diz o delegado.
A polícia investiga a presença de arsênio no sangue das vítimas, constatada após exames do hospital onde os sobrevivente estão internados. A origem do contaminante ainda é investigada.
As vítimas fatais são as irmãs Neuza Denize Silva dos Anjos e Maida Berenice Flores da Silva, e a filha de Neuza, Tatiana Denize Silva dos Anjos. Veja quem é quem no caso.
O marido de Neuza, que não consumiu o bolo, não apresentou sintomas. E o marido de Maida comeu o bolo, foi hospitalizado, mas já teve alta. Os nomes deles não foram oficialmente divulgados.
Bolo de Natal no RS: três das pessoas que comeram, morreram: Neuza, Maida e Tatiana.
Reprodução/TV Globo
A Polícia já ouviu cerca de 15 pessoas no inquérito que apura mortes de três mulheres da mesma família após comerem um bolo em Torres, no Litoral Norte do RS.
Zeli dos Anjos deve ser ouvida pela polícia quando estiver em melhores condições.
Na sexta-feira (27), policiais foram às casas de familiares em Canoas, Arroio do Sal e Torres para coletar mais elementos para a investigação.
Conforme a polícia, a família tinha boa relação e até o momento não é cogitado que haveria disputa por eventual herança.
Os laudos periciais no bolo, que têm previsão de ficarem prontos na próxima semana, poderão apontar se houve contaminação cruzada de alimentos e o que havia no bolo.
Análises apontam arsênio
Exames identificam arsênio no sangue de pessoas que comeram bolo
Os resultados das primeiras análises laboratoriais, coletadas pelo Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, indicaram presença de arsênio no sangue de uma das vítimas e dos dois sobreviventes que comeram o bolo. A substância é extremamente tóxica e pode levar à morte. Foram analisados o sangue da mulher que preparou o bolo, do sobrinho-neto dela – uma criança de 10 anos – e de Neuza Denize Silva dos Anjos, que morreu.
“O próprio hospital levou o material para o Centro de Informação Toxicológica. Nesse centro, foi constatado arsênio no sangue de duas vítimas que sobreviveram, que estão no hospital ainda, e de uma mulher que morreu, a dona Neuza”, explicou o delegado.
Os nomes da mulher internada e do sobrinho-neto dela não foram oficialmente divulgados.
Relembre o caso
De acordo com a Polícia Civil, na última segunda-feira (23), sete pessoas da mesma família estavam reunidas em uma casa, durante um café da tarde, quando começaram a passar mal. Apenas uma delas não teria comido o bolo. Zeli, que preparou o alimento, em Arroio do Sal e levou para Torres, também foi hospitalizada.
Três mulheres morreram com intervalo de algumas horas. Tatiana Denize Silva dos Anjos e Maida Berenice Flores da Silva tiveram parada cardiorrespiratória, segundo o hospital. Neuza Denize Silva dos Anjos teve como causa da morte divulgada “choque pós intoxicação alimentar”.
Segundo o delegado Marcos Vinícius Veloso, que conduz as investigações, Zeli foi a única pessoa da casa a comer duas fatias. A maior concentração do veneno foi encontrada no sangue dela. A polícia apura as hipóteses de envenenamento ou intoxicação alimentar.
A investigação encaminhou os corpos das três vítimas para necropsia no Instituto-Geral de Perícias (IGP), órgão responsável por atestar a causa da morte. Resultados devem ser divulgados nesta semana.
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Divulgação/Polícia Civil
O que é arsênio
Conforme André Valle de Bairros, professor de Toxicologia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), o arsênio é o elemento químico, enquanto arsênico é denominado para o composto trióxido de arsênio.
“O arsênico trata-se da forma mais tóxica. A partir de 100 mg é possível a morte de um indivíduo adulto. Geralmente, o arsênico está na forma de pó e não tem cheiro ou gosto. Apesar de ter sido usado como raticida, esta droga pode ser empregada para fins de tratamento oncológico em pacientes com leucemia promielocítica aguda e é comercializada como Trisenox”, explica o especialista.
Bairros assinala que arsênico é proibido de ser comercializado no Brasil como raticida e o uso como agente quimioterápico é restrito.
“O arsênio é um elemento de alta toxicidade conhecida pela humanidade e sempre houve um certo temor. Há locais no globo terrestre ricos em arsênio, e isso contamina fontes de água. Mas é algo que precisa ser muito investigado. Há literatura científica, e de fato, há essa contaminação em leite, carne e frutas, porém, o fato de estar expostos a concentrações maiores de arsênio não significa necessariamente uma intoxicação”, acrescenta.
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